Transcender é elevar. É ir além, ultrapassar limites e barreiras. É enxergar além do óbvio. Melhor: é conseguir fazer esse óbvio -tão fugaz- parte do todo dia. "Transcender é conseguir se perceber no universo, entender quem somos, da onde viemos e pra onde vamos": é conseguir praticar o exercício da espiritualidade, no sentido mais pleno e menos religioso da palavra. E se equilibrar. Equilíbrio é tudo nessa vida. E no meio desse caminho (percurso também é fim), "Cultivar o exercício da espiritualidade nos faz alcançar mais facilmente a dimensão da sustentabilidade". Essa entendida também no seu sentido mais pleno, e mais verdadeiro, que ultrapassa todas as áreas de conhecimento e, sim, chegam até você, até mim, até a árvore sendo cortada nesse segundo na Amazônia, até o catador de lixo no lixão: não tem como fugir ou fingir que não é com você. "Sustentabilidade é um movimento em favor da vida em equilíbrio".
Todas as aspas do parágrafo acima (e do resto do texto) são do jornalista André Trigueiro. Ele, que é também uma das principais referências em sustentabilidade no Brasil, tem bastante presente no seu dia-a-dia essa ideia de transcender. Transcender pode estar no sentido de extrapolar as áreas do jornalismo ao perceber que não existe política, economia, artes ou cultura que não conversem diretamente com a sustentabilidade. Pode estar no sentido de, lá atrás, em 1992, ter tido a cabeça aberta ao cobrir uma Conferência que falava sobre o meio ambiente e trazia a ideia de que desenvolvimento por desenvolvimento não vale de nada e que esse modelo que seguimos é ecologicamente predatório, socialmente perverso e politicamente injusto. Pode estar no sentido de ultrapassar as barreiras da sua profissão, jornalista, para ser ativista de uma causa que "não é uma escolha, é condição para que a gente continue empregando significado à palavra esperança".
"Só há esperança em um mundo em equilíbrio".
Depois de viver intensamente os dias da Rio 92 e voltar suas energias para aquela causa que já se colocava como urgente, Trigueiro foi atrás de informação. Fez cursos, uma pós-graduação em gestão ambiental e em jornalismo científico, criou um curso de jornalismo ambiental na PUC, escreveu alguns livros (entre eles Mundo Sustentável e Espiritismo e Ecologia), se tornou o primeiro colunista de sustentabilidade da CBN e falou muito, muito, muito sobre aquilo que é fundamental chegar ao maior número de pessoas. Mais que isso: ele entendeu que "O jornalista não pode chafurdar na lama, só revelar problemas e impasses e se especializar na crise: ele precisa sinalizar rumo e perspectiva". E entender que falar de sustentabilidade é falar de todas as áreas de conhecimento possíveis e que "A situação é grave, é crítica e requer um jornalismo que abra espaço para discutir as saídas que importam pra gente enquanto espécie ter um futuro menos sombrio e limitador das nossas capacidades".
Trigueiro sabe o poder que a comunicação e a informação tem e faz dessas ferramentas a favor do planeta para divulgar mensagens que tem que ser incorporadas e vividas plenamente por todos. "Todos nós temos o dever -ético e moral- de sermos guardiões da vida, esse planeta não foi criado para o nosso bel-prazer, somos hóspedes, estamos aqui de passagem".
Nessas, de acreditar que informação faz revoluções, que ele lançou um livro esse ano, o Viver é a Melhor Opção, que traz à tona um tema que é tratado como tabu e que, por conta disso, faz com que milhares de pessoas sejam diretamente afetadas por ele: o suicídio. "Segundo a Organização Mundial da Saúde, são 800 mil óbitos por suicídio por ano, o que dá 2200 casos por dia, 1 a cada 40 segundos e pra cada caso consumado há 20 tentativas que não deram certo e aproximadamente 6 pessoas diretamente afetadas por isso". Imaginou a quantidade de gente? Mais: "Em cada 10 casos, 9 são preveníveis por terem relação com patologias de ordem mental que poderiam ser diagnosticadas e tratadas". Mas não. O tabu não permite falar sobre isso. E foi por isso que, por 16 anos, ele foi juntando informações para criar esse livro, que vem para levar informação e tirar debaixo do tapete esse assunto que já é apontado pela OMS como a principal doença incapacitante para o trabalho até 2030.
"Prevenção se faz com informação".
E uma coisa é certa: Trigueiro faz tão bem e tão completo o que faz por ter entendido que esse, da sustentabilidade, é um discurso que não cabe só na fala. É daqueles que só faz sentido quando… sentido, literalmente. Daí, separar lixo seco e levar pra reciclagem, usar o lixo úmido pra fazer um minhocário, não ter nada que não seja de madeira certificada ou de demolição em casa, usar lâmpadas econômicas e eletrônicos com selo A, escolher abastecer o carro1.0 com etanol por ser menos poluente, só usar a máquina de lavar quando ela estiver cheia, comprar só o necessário…. isso tudo não é esforço. É natural. É equilibrado. E isso, ah, isso faz qualquer um chegar mais perto dessa coisa tão ampla e ao mesmo tempo tão simples que é transcender.
Em 1º de Janeiro de 2015 nascia o Menos 1 Lixo, um desafio pessoal da Fe Cortez, de produzir menos lixo e provar que atitudes individuais somadas constroem um mundo mais sustentável.